AO FINAL SÓ HÁ AMOR

Há quem diz que «o desejo mais profundo do ser humano é amar e ser amado». Estas palavras encerram uma profunda verdade e gostaria de estar de acordo com esta afirmação. Fomos criados por amor. Por amor nascemos através dos nossos pais. Portanto, experimentamos o amor de Deus através dos nossos pais. Ademais, aprendemos o que é o amor quando estabelecemos uma relação com os demais.

Todos temos uma história de amor interessante para contar. Todas as histórias de amor começam com um encontro. É fixar um dia, um lugar e uma hora para encontrar-se com alguém com quem quer estabelecer uma relação. Por isso quero partilhar uma história de amor significativa.

A minha história de amor com Jesus se formalizou com um encontro no dia 29 de abril de 2004, com a passagem evangélica de João 1:35-40: «Ao dia seguinte, João estava de novo ali com dois dos seus discípulos. Ao ver passar a Jesus, disse: “Olhai, o Cordeiro de Deus!”. Ao ouvi-lo dizer isto, os dois discípulos seguiram Jesus. Dando-se a volta, Jesus viu que o seguiam e perguntou-lhes: “Que quereis?”. Eles responderam “Rabi” (que significa “Mestre”), “Onde moras?”. “Vinde”, contestou-lhes “e vede”. André, irmão de Simão Pedro, era um dos que haviam escutado o que João havia dito e que haviam seguido a Jesus. Foram, pois, ver onde se hospedava, e passaram aquele dia com ele. Eram as quatro da tarde».

Tudo começou com o desejo de vir ver. Por outras palavras, de vir e aprender a amar. Era só um desejo sem uma convicção clara do que era o amor. O amor é uma ideia complexa. Eu costumava pensar que era fácil quando pensava nele. Depois de viver a minha vida consagrada durante 20 anos, cheguei a conhecer o significado do verdadeiro amor, já que agora estou no quinto ano de acompanhamento das jovens no noviciado.

Como se contam muitas histórias com significado, encontrei alegria em estar ali com elas. Tenho paciência para escutar as suas histórias de vida e acompanhá-las para que cresçam com o que Deus queria que fossem. Estas jovens procedem de diferentes realidades do mundo em que vivemos. É um mundo maravilhoso, mas cheio de discriminação, desigualdade, pobreza, miséria, guerra, corrupção, falta de modelos de conduta e diferentes tipos de violência e abusos.

Escutá-las é compreender as suas palavras já que a dor é profunda. Tenho medo de fracassar, necessito perdoar, ainda que eu não goste. Na realidade, tudo começou com os fracassos, estava confusa e não conseguia entender-me, queria chorar, mas não tinha mais lágrimas, sentia-me só. Sou boa o suficiente? Escutar-me-ão? E se algum dia me enamoro? Sobrevirei vivendo numa comunidade? É possível amar alguém a quem não posso ver?

No entanto, ao final, digo: aqui está a minha casa, sinto que pertenço aqui. Aqui sou livre de me expressar, aqui aprendo a amar e a perdoar, aqui cresci, aqui me curo, aqui sinto a presença de Deus e aqui aprendo a arriscar e a comprometer-me com o AMOR.

É isto o amor? Pergunto-me… Não se faz nada de extraordinário. Simplesmente escutar as suas histórias, às vezes aborrecidas, outras loucas e divertidas. Simplesmente estar ao seu lado, aprender delas, olhá-las nos olhos e perguntar-lhes: estão bem hoje? Trabalhar com elas, convidá-las a passear, montar em bicicleta com elas, comer mangas verdes debaixo das mangueiras, cantar e rezar com elas, dançar e ver filmes com elas, jogar debaixo da chuva e fazer selfies com elas.

Ademais, partilhar com elas o que está a acontecer no nosso mundo, onde os ricos se fazem mais ricos e os pobres estão cada vez mais pobres. Questiono-as para que pensem criticamente porque há guerra em Myanmar, em Ucrânia, em Israel, em Gaza e noutros lugares. Porque é que a China e os Estados Unidos são tão poderosos? Porque há tanta pobreza em Sudão? Que fazer com a gente que vive na rua a mendigar para sobreviver em Manila apesar de ser um país católico? Discuto com elas sobre as crises do nosso entorno, conversamos sobre os abusos sexuais na Igreja, o papel das mulheres na Igreja, sobre o que passa aos jovens e porque se afastam da Igreja. E porque é que a vida religiosa não se considera relevante nas nossas sociedades atuais?

Também, animo-as para partilharem do pouco que têm para ajudarem aos mais frágeis do grupo e estenderem a mão aos pobres e necessitados, recordando-lhes que se queremos mudar o mundo, temos que mudar nós mesmas, a aprofundarem em si mesmas para descobrirem o tesouro do seu ser e fazê-las compreender que estamos aqui para uma missão.

Às vezes surgem conflitos sobre como aceitar o que é diferente de nós. Falamos em inglês filipino, em inglês timorense, em inglês indiano, em inglês birmano, em inglês vietnamita, em inglês britânico e em inglês americano, mas no final, falamos em inglês. Em certos momentos ouvimos dizer que na India somos assim, em Vietnam cozinhamos assim, em Timor Oriental falamos assim, em Filipinas fazemos assim, e muitas outras diferenças entre nós. Contudo, as convidamos a abraçarem a singularidade de cada uma, a cooperarem e a ajudarem-se mutuamente a crescerem na unidade para trabalharem juntas por um mundo melhor. Ao fim e ao cabo, nos necessitamos umas às outras, todas nos pertencemos, e pertencemos a uma grande família de Deus, pertencemos a uma Congregação missionária para viver a interculturalidade.

Uma vez mais me pergunto isto é amor? Sim, o é. É amor porque JESUS é a fonte do amor e sinto uma alegria inexplicável no meu coração, e experimento o prazer de servir e amar. Ademais, a passagem evangélica de João 14:21-26 nos convida a uma profunda compreensão do amor e da obediência, pois Jesus revela a beleza da intimidade divina. «Jesus disse aos seus discípulos: «O que recebe os meus mandamentos e os guarda, o que me ama será amado por meu Pai; e eu também o amarei e me manifestarei nele».

Todavia estou num longo caminho para aprender o verdadeiro amor, especialmente para amar a missão de acompanhar as noviças. No entanto, ao crescer como filha de um agricultor, aprendi que o processo de acompanhamento é como o processo de cultivar um campo. O processo é: Preparar a terra, lançar as sementes e plantar. Algumas sementes crescem muito rápido, outras são lentas, algumas estão sãs e outras são débeis, mas todas tentam crescer. Todas têm potencial e são responsáveis pelo seu crescimento. A minha tarefa é regá-las fiel e responsavelmente, cuidá-las e por vezes pôr-lhes algo de adubo. Sobretudo confiar no DADOR DA VIDA.  Vê-las crescer cada dia me dá muita alegria. Espero vê-las manterem-se firmes na opção que elegeram, a terem confiança para enfrentar a vida, e responsáveis para serem mulheres para os demais, a partilharem e a ajudarem a crescer os outros, a partilharem o amor que experimentaram depois de saírem do noviciado.

Ao final, só é amor, como afirma Santa Catarina de Sena: o coração humano sempre se sente atraído pelo amor. Por isso, quando são enviadas às comunidades depois da Primeira Profissão, as comunidades são lugares onde são aceites, escutadas, implicadas, valorizadas, acolhidas, cuidadas e amadas, porque o nosso maior desejo para os seres humanos é amar e ser amados.

Maria de Fátima Pui

Noviciado Continental Asiático, Manila, Filipinas.

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